segunda-feira, 8 de novembro de 2010

GROGUES, CEGAS E VIOLENTAS!

Maíra (guitarra) Cynthia (Bateria) Carol (baixo)

By Maíra Tito

O primeiro contato entre as Grogues, Cegas e Violentas! foi intermediado pelo produtor desse blog, Valquir Fedri, e não podia ter acontecido em local mais propício: o ônibus que levava o pessoal de Londrina para ver o show dos Sex Pistols em São Paulo, na volta da banda, em 1996. Eu havia comprado uma Sonelli semi-acústica dos anos 1960 do Valquir e ele havia me dito que eu devia conversar sobre montar uma banda com outras duas garotas que ele conhecia, a Carol Avansini e a Cynthia Ito. O papo na estrada, regado a cerveja e adrenalina pelo evento que iria acontecer à noite, rendeu o compromisso de um encontro para conversar.
Cheguei no apartamento das meninas com meia dúzia de latas de cerveja, me perguntando se eu estaria sendo inconveniente, mas fui recebida muito bem, e as cervejas foram recebidas melhor ainda (grogues!). A Carol e a Cynthia eram graduadas em jornalismo e estavam cursando Ciências Sociais na UEL. Eu fazia o terceirão no Maxi.
O primeiro ensaio também não poderia ter acontecido em local mais propício: a sala de espera de uma clínica ginecológica (hoje Casillero Bar), que naquele sábado estava fechada e pertencia ao pai do Raul um amigo nosso. Aquela tentativa tosca de interpretar covers de Verme (Garotos Podres), What do I get? (Buzzcocks), Train in Vain (The Clash), entre outras, naqueles instrumentos desafinados e sem a menor técnica, foi registrada pelo Valquir em vídeo. Ah! “Sem nenhuma técnica” é exagero: eu e a Carol havíamos tido um par de aulas de guitarra e baixo com o Humberto e Rodrigo, os Cherry Bomb, e a Cynthia tinha noções de bateria.



Primeiro Ensaio sala de espera de uma clínica ginecológica (hoje Casillero Bar)
Acervo: Valquir Fedri

O primeiro show foi no quintal da casa do David, no bairro Interlagos, reduto punk na época que concentrava as casas do Roxinho, David, e mais alguns que não lembro (grogue!). Nessa época já tínhamos músicas próprias como a que leva o nome da banda, “Grogues Cegas e Violentas!”, “Azar” e “Thirsty Girl”. A propósito do nome, surgiu espontaneamente da reunião de nossas características na época: o gosto pelos etílicos, o fato de usarmos óculos e termos um comportamento um tanto agressivo com quem tivesse a péssima ideia de antagonizar com alguma das três.



Teatro Zaqueu de Melo 11/12/1997 - Acervo: Valquir Fedri

Em pouco mais que três anos de banda, evoluímos muito musicalmente, a ponto de o último show, em dezembro de 2000, no legendário 92 Graus em Curitiba, ser realmente muito bom, ao menos na minha opinião e na das pessoas que o assistiram – umas 10, no máximo.
Éramos rápidas, precisas, tínhamos estilo e criatividade, embora a técnica não passasse muito do rock'n'roll básico. Alguns deslizes haviam ficado no passado, como quando começávamos a tocar uma música diversas vezes e parávamos ao perceber que não dava certo, porque cada uma estava tocando uma música diferente (cegas!). Os shows tinham, geralmente, um público razoável e empolgado. As influências variavam do punk 77 (nacional, americano e inglês) ao rock'n'roll dos anos 60 e outras coisas obscuras que cada uma curtia. Nesses anos de banda contamos com a colaboração de muitos amigos, como os Estilhaço, os Cherry Bomb, os Cyclone Pill, que sempre nos emprestavam equipamento, instrumentos e ajudavam no som. Ou os namorados (Roxinho, Cibié, Kiko, Lucas, Pablo, Osmar, Coxinha, Luiz Teddy) que nos levavam para casa depois de uma noite catártica e nem reclamavam no dia seguinte. Muitos outros que não lembro agora (grogue!) foram imprescindíveis para que essa história tenha sido escrita.
Mas se há uma marca que nos identificava mais do que as outras, era a ATITUDE. Estávamos entediadas com a cidade e com o mundo, queríamos chocar, éramos livres. Toda ideia de qualquer integrante da banda era bem-vinda, gerando um espaço de catarse (violentas!). Pixamos muros com letras dos Ramones, espalhamos isopor picado pelo Bar Potiguá, tocamos no anfiteatro do Zerão e no Teatro Zaqueu de Melo usando saias tão curtas que era provável que mesmo quem sentou nas fileiras mas distantes podia ver mais do que deveria.


Organizamos desfiles de moda punk, desprezamos a estética dominante com nossos coturnos e cabelos curtos. Desafiamos o machismo que impera até mesmo no circuito underground, deixando de nos privar de qualquer coisa que quiséssemos fazer, ainda que fosse costume restrito aos círculos masculinos. Invadimos palcos (ainda que em local não apropriado, como no show do IRA! no Clube Canadá). Ensopamos de cerveja os músicos nossos amigos (coitada da Rickenbaker do Humberto!). Pogamos. Viajamos para tocar em Curitiba, Guarulhos, Ibiporã, Cambé, Presidente Prudente. Nos orgulhávamos de não ser apenas as namoradas que seguram as jaquetas dos caras quando eles vão tocar e levam cerveja no palco para os amados. Estávamos no palco e estávamos lá para causar uma impressão.
A banda acabou quando a Cynthia casou-se e foi morar um tempo no Japão. Nosso legado é uma fita-demo (Grogues, Cegas e Violentas!) e um cd-demo (We're not nice girls for them), ambos gravados em estúdio, ao vivo e reproduzidos manualmente. São gravações simples, diretas e contundentes. Assim como foi a história das Grogues nas ruas de Londrina, uma Londrina muito diferente da de hoje, onde se podia comprar vinho na Adega da rua Brasil e sair bebendo tranquilamente pelas ruas frias e cobertas de nevoeiro na madrugada. Uma época autêntica, inesquecível, sem frescuras.



Teatro Zaqueu de Melo 11/12/1997 - Acervo: Valquir Fedri





CD gravado e mixado no estúdio Dinamus em Fevereiro de 2000

Fotos da Capa e contracapa - Rogério Ivano

Arte - Kiko

Para Download click aqui http://www.4shared.com/dir/oZhazWeg/sharing.html


Carta Manifesto que acompanhava o CD

Agradecimentos

Juan Diaz pelas digitalizações

Lucas Ricardo, pelos arquivos.